A sociedade como um todo, leigos e especialistas, recomendam sistematicamente, de maneira formal ou informal, coisas que seriam importantes para nós. Talvez nossos pais nos alertem para a importância de se alimentar bem, nossos professores para a importância de estudar, nosso médico para a importância de fazer atividade física, etc., etc. Muitos psicólogos, talvez, recomendem a importância de cuidar da saúde emocional. Todas estas recomendações são, de fato, importantes por duas razões principais: 1) Trazem benefícios para a pessoa que as segue, e 2) Trazem benefícios para a pessoa que fez as recomendações. Seguir uma recomendação médica de fazer atividade física, por exemplo, costuma trazer benefícios para a pessoa que a segue, como obter uma fonte de relaxamento, e para o médico, como ver seu paciente com a saúde em dia e ter seu trabalho reconhecido.
Em meio a tantas recomendações que escutamos, porque alguém recomendaria a importância de construir relações de intimidade? Primeiro, chamo aqui relações de intimidade aqueles relacionamentos onde uma pessoa compartilha sentimentos, pensamentos e coisas da sua vida com outra pessoa que, ao invés de criticar, julgar ou reagir de algum modo negativo, acolhe, escuta, compreende e também compartilha suas coisas. Uma relação de intimidade pode se dar em vários níveis, como na relação entre pais e filhos, entre amigos, entre parceiros e não envolve, necessariamente, como às vezes é difundido no senso comum, uma relação sexual.
Vamos ver um exemplo. Suponha que você tenha uma fantasia sexual incomum que, se compartilhasse com alguém não próximo, você sofreria críticas, preconceito, ou algum tipo de desaprovação. Suponha que um dia você tome coragem e conte esta fantasia para o seu parceiro. Ele a critica com uma frase do tipo "isso é coisa de vagabunda, esqueça!! Não vou fazer isso!!". Embora ele seja o seu parceiro, essa relação não se configura como uma relação de intimidade como a definimos aqui. Por outro lado, digamos que você tenha uma amiga de longa data, de confiança. Você compartilha esta fantasia com ela e ela reage com entusiasmo, não faz juízos de valor do tipo "isso é errado" e pede que você conte mais sobre esta fantasia. Temos aqui uma relação de intimidade, onde o compartilhamento de um desejo íntimo passível de reprovação foi acolhido e compreendido.
Pois bem. Não é necessário muito esforço para perceber que desenvolver este tipo de relacionamento com alguém nos dias de hoje não é fácil, exige esforço e uma boa dose de coragem para se expor aos riscos de uma sociedade marcada por preconceitos e que é implacável em seus julgamentos morais. Entretanto, não é uma missão impossível. Se relacionar com alguém de forma íntima é uma questão de aprendizagem. Ninguém nasce sabendo esse tipo de coisa. É evidente que o objetivo deste texto não é ensinar esta habilidade, mas apenas despertar a atenção para a sua importância.
Nesse sentido, praticar formas de se comportar intimamente - expondo pensamentos e sentimentos - pode levar a relacionamentos muito mais gratificantes por algumas razões: aumenta a autoestima ("o que penso e sinto tem valor para alguém"); aumenta os sentimentos de segurança e de pertencimento ("não estou sozinho(a) no mundo, tenho alguém com quem contar"); alivia sentimentos negativos como tristeza, solidão e vazio, dentre outros benefícios que envolvem, inclusive, a saúde física. É muito comum as pessoas se queixarem de um sentimento de vazio que não sabem de onde vem. Talvez venha da falta de relações de intimidade. Aliás, muitos problemas emocionais e mesmo físicos decorrem da ausência de relações de intimidade. Como foi dito, apesar de ser uma tarefa difícil construir um relacionamento íntimo, o investimento é bastante válido. É como trabalhar anos e anos para comprar um carro, por exemplo. O processo é trabalhoso, envolve riscos, perdas, dificuldades, mas, no final das contas, o resultado é recompensador. Assim como conquistar um carro, conquistar uma relação de intimidade (note bem, apenas uma), seja com um amigo, com um parente, com um parceiro, etc., já terá valido a pena. Você já parou pra pensar quantas relações de intimidade tem atualmente? Quantas deixou pelo caminho? O que tem feito para desenvolvê-las? Como estaria sua vida se tivesse mais intimidade nas suas relações ou mais relações de intimidade?